Absolver e absorver...

Tem coisas que a gente tem que absolver e outras coisas que a gente tem que absorver....
Costumo "absolver"minha pele marcada pelo tempo , meus cabelos brancos, dar um desconto às rugas e vincos e não me deprimir com comparações do que fui e do que sou.Foi o preço que paguei pela "vida vivida"...Reclamar do que?

Mas o que fazer quando seu filho completa 40 anos?
E os outros: 37, 35, 33, 30...

Percebo que não é a minha idade que determina que envelheço; é a idade dos meus filhos!
"O tempo passou na janela só Carolina não viu...."é o que diz a música de Chico Buarque.

É preciso "absorver"isso. ....

Há tão pouco tempo atrás enchia o carro de crianças e saia distribuindo pelas escolas;as férias na praia, as bicicletas, os parques os almoços de domingo no Frango Assado...As piscinas de plástico, as motocletas, as balanças e gangorras dos parques.
Foi ontem....
Resta esperar que eles não só tenham saudades da infância e adolescência passadas....mas saudades desse tempo sem volta, desse ciclo de vida, vivida em família.

O tempo passou, a relação mudou....com as "ex-crianças"!

Já não sou a mãe que pode dizer tudo que quer e que sente.
O amor torna-se cheio de cuidados e pudores: pisa- se em ovos porque é preciso reconhecer que aquele que está ali é um adulto que já passou mais tempo vivendo outras histórias em outros mundos que aquele passado em familia.
E é muito valioso o tempo que dispõem para nos ver e rever....
Então é só festa, só alegria, só afago no ego, mesa farta com comida de mãe misturada com reminiscências.Percebe-se (mas não se fala) os primeiros cabelos brancos, as primeiras marcas do tempo.

Nunca dizem que me amam. Só me elogiam quando não estou junto.Entendo; pieguice não é o forte dos homens.
São ciclos de vida que se encerram; deixamos no passado momentos que foram ótimos mas que
simplesmente se encerraram, porque assim é a vida.

E abrimo-nos para o que está por vir:novos netos, novos projetos, mudanças de casa e de vida, surpresas ....


"Que vou pelos caminhos demonstrando,

e como se outro ser, não mais aquele habitante de mim há anos,

passasse a comandar minha vontade que, já de si volúvel, se cerrava

semelhante a essas flores reticentes em si mesmas abertas e fechadas....."

(....)

" e a máquina do mundo recompondo,

enquanto eu, avaliando o que perdera,

seguia vagaroso de mãos pensas."



Carlos Drummond de Andrade

Máquina do mundo